
TORTURA
Florbela Espanca
Tirar dentro do peito a emoção,
A lúcida verdade, o sentimento,
- E ser, depois de vir do coração,
Um punhado de cinza esparso ao vento!…
A lúcida verdade, o sentimento,
- E ser, depois de vir do coração,
Um punhado de cinza esparso ao vento!…
Sonhar um verso d’alto pensamento,
E puro como um ritmo de oração!
- E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum momento!…
E puro como um ritmo de oração!
- E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum momento!…
São assim ocos, rudes, os meus versos:
Rimas perdidas, vendavais dispersos,
Com que eu iludo os outros, com que minto!
Rimas perdidas, vendavais dispersos,
Com que eu iludo os outros, com que minto!
Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse, a chorar, isto que sinto!
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse, a chorar, isto que sinto!
(Florbela Espanca - Livro de Mágoas)
FLOR BELA
Regina Coeli
Da terra sempre vem do coração
A flor que é puramente verdadeira,
Que se abre à luz do sol, completa e inteira,
Depois passando ao pó de uma ilusão.
Cantada em tom de verso e de canção,
A flor vive o seu tempo na floreira
Ou num jardim, qual rosa na roseira
Junto do espinho em santa comunhão.
Teus versos podem ser os girassóis
Pendendo diante de olhos à janela
Que os leem e se sentem menos sós...
No Tempo o verso triste e altivo sela
Teu nome, refrigério aos nossos nós,
Perfume da Poesia, tu, Florbela!
(Rio de Janeiro, 20-02-2011)