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SONS DA NATUREZA



Quando alvorece, passarinhos piam e trinam sem parar
Anunciam novo dia que vai começar...
Em meio a ruídos de bem-estar
O canto firme do bem-te-vi se faz ecoar 

Durante o dia, ouvem-se sons lá e cá:
o lamento tristonho do sabiá,
as folhas pisadas pelos pardais nos ramos em tênue sibilar,
insetos a voar , alguns a zunir, e  um grupo de cambaxirras a chiar  

O que dirá o Sol, astro-rei,  lá no alto a irradiar 
calor em forma de raios que fazem toda a Vida desabrochar?
No silêncio da sua quentura e do seu brilhar, quem sabe queira aconselhar 
os corações humanos  que as relações interpessoais eles devem iluminar...  

Novos sons, inconfundíveis,  ponho-me a escutar
Um grupo de estridentes maritacas a passar
Juntas, emitem gritinhos de quem tem alegria pra gastar
Regale-se aquele que ainda tem sensibilidade para escutar!  

Em meio a tantos sons distintos da natureza a se mostrar
- que vão da timidez até ruídos de um gostoso incomodar -
junte-se o de sementes em favas a estalar,
como gravetos secos em carícias com o fogo na lareira a crepitar... 

Sons quase imperceptíveis de folhas a se quedar
de árvores e plantas onde se esgotou o seu ficar...,
atropelados pelo bater das asas de pombos e seu arrulhar
A natureza pintada de ruídos de vários tons para se escutar... 

A tarde cai e com ela uma série de ruídos  a se avizinhar
Os passarinhos guardam o canto e as asas para descansar
Os irerês, em bando, retornam em suave baderna de algum lugar
Decerto já têm pouso costumeiro onde se aquietar...

Ao longe,  ouve-se o bucolismo do  galo a cucuricar
Anunciando a noite que chega para aconchegar 
Este mesmo galo canta a madrugada a se espreguiçar
E, no correr do dia, a galinha cacareja o ovo que acabou de botar... 

Na noite alta, quando o homem inicia o seu descansar
Grilos trilam, ao som do sapo que se queixa no seu coaxar
Ou do atrevido sapo-martelo que desafia com o seu martelar, 
enquanto rãs espertas cantam ou se lamentam..., deixa pra lá... 

Elas se escondem em charcos d'água ou no regato, para conversar
com ele, a murmurar; enternece-se  a sensibilidade que consegue captar 
que os sons eclodem na natureza em qualquer lugar,
anunciando a Vida com todo o seu esplendor e seu diversificar 

Cães latem, enchem o espaço com o seu ladrar
Nas sombras da  madrugada, a passarada ensaia o seu despertar
Sons há, de toda a ordem , enchendo de agrado quem os pode escutar
E ouvir da natureza tudo o que Ela tem para nos falar...  

Olhando para cima, vejo a lua e o seu prateado luar
E as estrelas, luzindo fagueiras em seu brilhar  
Que som emitem, hão de me perguntar?
O som do silêncio que leva à contemplação, ouso afirmar...

Quando  nuvens escuras prenunciam chuva que vai chegar, 
às vezes se acompanham de ventos fortes que rugem e silvam no ar
A Natureza parece extravasar
seu lado menos suave, outro encantar... 
   
E o som da chuva, banhando as folhas e flores com vagar?
É espetáculo sonoro que serve para acalmar
corações tristonhos e mentes revoltas no seu atribular...
Busca incessante de lenitivo para as mágoas em nosso caminhar... 

O que dizer da tempestade a desabar,
do relâmpago não-sonoro a relampejar, 
pano de fundo para o trovão a vociferar
e do raio cintilante e  belamente medonho a  faiscar? 

Em forma de véu, a água  a cascatear
em mansidão no seu cair e em gostoso espocar
quando beija o chão, as pedras ou outras águas no seu passar...
A Natureza revelando os seus segredos em diferentes formas de chorar...  

Chega-se ao mar, ah!, aí é difícil falar...
O mar, tesouro da Criação que não canso de admirar...
O mar, depositário dos meus desejos de moça em meu despertar...
Águas calmas ou bravias, sempre me encanto com os sons do mar!...  

E o Homem, também ele filho natural, ser que sabe revelar
sons magníficos nas palavras ditas e nas canções feitas para enlevar...
... quando os ouvidos ouvem e levam para a alma se deliciar
angelicais melodias que não ousam a quietude macular... 

Verbos que traduzem a calmaria  de ações como sussurrar,
murmurar e cochichar parecem não ter mais lugar,
jazem nos dicionários ou são usados por gente antiga em seu plácido falar,
ou vivem nos versos dolentes dos poetas em seu versejar...  

Ah! esses mesmos homens (ou serão outros?) a teimar...
com barulhos e ruídos, sons enlouquecidos a estrondar...
Gritos guturais que agridem os ouvidos e sujam o ar,
desafiando os outros sons na sua função de enfeitar...  

Se são esses os sons da modernidade, tenho a lamentar:
são sons aos quais não posso, não quero me acostumar,
pois mostram a feiura do Homem e seu agressivo extravasar,
como se ele os seus ruídos não conseguisse calar... 

Aqueles que, como eu, puderam e podem se deleitar
com tanta beleza em forma de som para escutar,
talvez comigo concordem: não dá para aceitar
que à nossa Vida tenhamos, de bom grado, que tais sons incorporar... 

E, àqueles que porventura, por escárnio ou por esgar, 
disserem-me que, na velhice, de barulhos estou a me desacostumar,
peço desculpas e, em tom baixo mas firme, teimo em afirmar:
não será agora que em meu sangue esses barulhos deixarei entrar! 

Se em mais de meio século não consegui suportar
pesadas falas que causam incômodo e mal-estar,
digo-lhes, fiel ao que sou e deixando o último verso sem rimar:
 não se pode se desacostumar daquilo a que nunca se foi acostumado!

E viva a bela Natureza em seu desfilar...


Cartas de alforria
Escritos de Regina Coeli
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